Figas
MÃOS ANCESTRAIS

Figas: atos e gestos para a transfiguração simbólica – ritual
A mão humana grafa o gesto – ritual. Uma vez direita, outra esquerda, ela contorna encruzilhadas, mistérios e saberes ancestrais tornando-se Figa: uma ação em que o dedo polegar enfiado entre o indicador e o médio transpõem a eloquência do gesto e se materializa em símbolo.
O conjunto de obras “Figas, mãos ancestrais” são representatividades de uma investigação que busca atualizar o sentido do símbolo Figa a partir da experiência-gesto afro-brasileira. As doze mãos: suas formas e sinais, configuram as inquietações do fotógrafo na composição imagética de elementos e práticas que fazem parte do seu entorno. Roque nasceu em Santo Amaro da Purificação, Recôncavo Baiano, espaço: corpo-território de resistência cultural e religiosa. Nesse locus, sua sensibilidade se amplifica tornando-se uma Força para manifestar genealogias e memórias através da visualidade.
Numa experiência autoperceptiva, a “Figa Omolu” abriu em lapso o meu campo de sentidos e deflagrou em mim um estado psíquico de recordação de quadros clínicos da infância conectados com a pele, as marcas de ascendência, as doenças cutâneas... Em questão de segundos - um lampejo de memória; um grito. Depois veio o silêncio que contorceu minha mente, e o que inicialmente tinha significado no campo da individualidade adquiriu uma conotação mais ampla, ou percepção expandida, uma totalidade cada vez maior que eu poderia chamar de conexão ancestral do poder do gesto-ritual ou o “transe” que as imagens coreografadas por Roque Boa Morte nos provocam.
Juci Reis
Curadora



Esta série advém de um processo de experimentação estética e de pesquisa sobre as camadas de símbolo e significado incorporadas ao ícone Figa desde o seu nascimento na europa mediterrânea até chegar ao Brasil por mãos africanas.
Trata-se do amuleto mais popular do ocidente que, em contrapartida, até os dias de hoje, não havia sido investigado visual e simbolicamente em contexto afrodiáspórico; embora alguns trabalhos sobre joias de crioula ou mesmo sobre achados de sítios arqueológicos trouxessem notas sobre ele.
Deste ponto de partida, proponho a construção de visualidades e pesquisa junto a duas comunidades referentes (Gantois, em Salvador, e Ilê Axé Ojú Onirê, em Santo Amaro) em seus usos e costumes do citado amuleto, dentro da tradição banto-yorubá, muito pulsante na Bahia.



Cada figa foi materializada na mão do respectivo filho do Orixá a ela relacionado, que contribuiu com suas joias de axé, conhecimentos sobre as deidades e tradição do amuleto no contexto do seu grupamento.
Seguindo esta lógica, a flecha encontrada na Figa Oxossi em forma de bracelete, a cor da conta que envolve a mão da Figa Yansã, o tipo de metal empregado e o búzio em joia de ouro na Xangô; o branco total na Oxalufã e o tridente na Exú, foram utilizados como chaves de deslocamento do sujeito observador até a memória histórica contida em cada ícone justaposto no/enquanto amuleto/talismã.
O processo de produção das obras, porque não só o seu resultado importa para neste tipo de construção, contou com pesquisa da tradição oral e fontes bibliográficas, bem assim: foi documentado em audiovisual e registros escritos para pretensas publicações futuras.

Aláfia!
Roque Boa Morte








